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sexta-feira, 2 de abril de 2010


PAIXÃO DE JESUS
Ao entrarmos com o cuidado devido no relato da Paixão, isto é, quando experimentamos e vivenciamos o relato da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo nos encontramos com sua força e com sua fraqueza.
Da sua força, porque não nos será possível vê o relato do sofrimento, paixão e morte de Jesus apenas de fora, na platéia como espectador. Não tem como fazer uma experiência profunda do relato da paixão e morte de Jesus Cristo sem estarmos acusados e atravessados por ele: Porque está diante de nossos olhos desvendado a profundidade da nossa cólera e do nosso ódio, da nossa astúcia, da nossa brutalidade, da nossa calúnia e do fascínio pelo sangue inocente. Quem diria que sobre nós paira o deseja da morte? (Pasta presenciarmos um acidente e todos e logo nos juntamos em multidão para nos deliciarmos do sangue derramado e do corpo caído sem vida). Em contraponto, está ai diante dos nossos olhos atônitos, revelado o semblante da verdade, do amor gratuito e do Perdão setenta vezes sete, isto é, do perdão sem limite que acolhe a nossa violência e o nosso pecado levando-os até fim do círculo vicioso e ferrenho da retaliação e vence a vitória sobre a penúria que germina da natureza do pecado, cujo efeito é sempre acorrentar, encadear, entrelaçar.
É no ambiente do Antigo Testamento que o relato da Paixão busca seus elementos; apresentam às súplicas dos Salmos, como o silêncio do Servo de YHWH, (Sl 21), e outras narrativas da toráh, Sabedoria, Cântico dos Cânticos, dos Profetas e tantas outras citações nascidas das Sagradas Escrituras.
É verdadeiramente um relato. Porque põe em analogia, une e entrelaça duplamente: primeiro, porque faz uma analogia dos acontecimentos; segundo, porque põe em afinidade o narrador e a narração do sofrimento paixão e morte de Jesus.

Onde começa o relato da Paixão e onde termina?
Então vamos começar o relato da Paixão no mistério pascal com a Ceia Primeira, que nos envolve e nos implica no corpo e na memória. Porém Evangelho de São João, no capítulo 13, que meditamos ontem, narra em vez da Ceia o lava-pés. Repito: como vimos ontem no IV evangelho. O narrador abre a cena, referindo que Jesus depõe o manto (v. 4), e fecha a cena, dizendo que Jesus recebe o manto (v. 12). São os mesmos verbos com que, no Capítulo 10.º, o Bom Pastor depõe a vida e recebe a vida (v. 17). Entre uma e outra ação, entre depor o manto e receber o manto, depor a vida a vida e receber a vida, no centro (v. 8), está o discurso solene de Jesus: «Se não te lavo, Pedro, não tens parte comigo!» (Jo 13,8). Ter parte com Cristo é participar no seu supremo serviço de amor até dar a vida como Ele faz.
Vinculados no corpo e na memória, na vida e no serviço do amor, atravessamos o caminho do sofrimento e entramos no jardim das oliveiras. É de noite, mas abrasa a luz. É verdade que já não estão todos. Judas, filho de Simão Escariotes afastou-se da luz e perdeu-se na nas trevas da noite, (Jo 13,30). Virá depois com tochas e lanternas, e com soldados e armas (Jo 18,3). Vem prender a luz, mas cai encandeado por ela (Jo 18,6). Tem de ser a luz a deslumbrar-se por amor e a entregar-se a ele por amor.
Aqui é preciso, lembrar o relato de São Marcos que diz: todos fugiram, abandonando-o (Mc 14,50). E fugidos andaremos, e perdidos, na noite e no frio, até sermos outra vez por Ele encontrados e recolhidos. Mas, Pedro ainda perdido, se abriga a outra luz e nela se aquece (Jo 18,18). Negando ter andado com Jesus, ter alguma coisa a ver com Jesus, ter parte com Jesus. Nega mesmo conhecer Jesus (Mc 14,67-71). Até que o galo canta, e começa a nascer o dia para Pedro, (Mc 14,72). Mas Jesus prossegue o seu caminho de amor até ao fim. Até à Cruz. É lá que se desvenda o rosto abatido pelo sofrimento e o gosto pela morte que nos cerca. Salva-te a ti mesmo! Gritava os soldados (Lc 23,35. 37.39). E gritamos, ainda hoje, repetidas vezes, mas zombando, porque, na verdade o que queriam eles e o que queremos nós, não é que Ele se salve; o que queremos mesmo é assistir ao doentio espetáculo do sangue gotejando junto com água do lado aberto do Inocente, queremos assistir o espetáculo sombrio da morte! A tanto chegou a nossa maldade! Um ódio sem motivo, sem fundamento, jaz-nos (Sl 35,19; 69,5; Jo 15,25). Ele é o Justo. Ele é a Bondade e o amor absolutamente gratuito, sempre Primeira e radical, igualmente sem motivo e sem fundamento Ele nos ama e ama Primeiro (1 Jo 4,19), quando ainda estávamos no pecado e éramos pecadores (Rm 5,8). Ali, naquele Corpo Crucificado, morto por amor, e por amor exposto diante dos nossos olhos atônitos (Gl 3,1), morre o nosso desejo de morte, o nosso pecado, apagado pelo fogo do amor gratuito, que declara os nossos pecados completamente apagados, perdoados, anulados e ultrapassados (cf. Cl 2,14). Podemos agora olhar a Cruz de outra maneira. Afinal, ninguém nos fez frente. E encetando o caminho retrospectivo do olhar e da memória, podemos começar agora a entender que aquelas chagas são o espelho em que podemos ver a nossa violência, a nossa malvadez, o nosso pecado. Como toda a «paixão», a «Paixão» de Cristo expressa passividade provocada por numerosas vontades humanas. A «Paixão» de Cristo revela a «ação» de outros, a nossa «ação». E podemos ir mais longe e confessar a única verdade disponível: «Nós somos culpados!» Ou não veio Ele para que se manifestem os pensamentos escondidos de muitos corações? (Lc 2,35). Mas confessar sem medos, sem receios, porque nenhum tribunal nos julgará, nenhuma retaliação se adotará, nenhuma ameaça nos persegue. Esta é a descoberta esplêndida! Ninguém nos acusou. Nem Deus nem o Servo Justo, Cristo. Nenhuma acusação impende sobre nós. Nesse sentido, aquele Corpo aos nossos olhos exposto e relatado, aquelas chagas abertas, podem ser verdadeiramente a nossa cura (1 Pe 2,24; cf. Is 53,5). Está ali tudo exposto. Tudo às claras. Como a venenosa cobra em nós escondida e acobertada, mas agora levantada diante dos nossos olhos. Fica ali bem à vista a imagem do mal de que padecemos. Podemos, portanto, agora que sabemos qual é o mal em nós e que conhecemos o remédio, aceitar o processo da cura. «Assim como Moisés levantou a cobra no deserto (Nm 21,8-9), assim «é necessário» que seja levantado o Filho do Homem» (Jo 3,14). O relato da Paixão põe em cena o «corpo a corpo». «É necessário» que seja o Bem a vencer sem combater este combate. Só o Bem é livre. O Bem não começou. O Bem é Primeiro e é para sempre. O mal é que começou e se multiplica, até ser completamente anulado pelo Bem. Perdão infinito. A mais abatida amostra de Bondade e Gratuidade manifesta-se no dom feito aos mortos. A Escritura de teor apocalíptico, faz-nos ouvir a oração dos mortos (Dn 9,4-19), ensina-nos a rezar pelos mortos (2 Mac 12,42-45), e concede o Perdão aos mortos (Dn 9,24), sem que os mortos tenham de voltar à vida para serem perdoados. Antes, são trazidos à vida no próprio ato com que são perdoados. A verdadeira morte não é o termo da vida, mas aquilo que, desde o princípio, impede de nascer. E aquilo que impede de nascer para a Liberdade são as raivas e os ódios, a violência, a agressão e a opressão são pecados que escravizam o coração do homem e da mulher.
O ato que muda o coração e que retira o corpo da morte é um só e mesmo ato, o ato de amor gratuito. O percurso verdadeiro não é o que fazemos da vida para a morte, mas o que fazemos da morte para a vida. Não vivemos para morrer, mas morremos para viver. E é o amor que faz passar da morte para a vida (1 Jo 3,14; cf Jo 5,24). É neste cone de luz que se situa o relato de Mateus quando refere que, com a morte de Jesus, «muitos túmulos se abriram e muitos corpos dos mortos santos ressuscitaram» (Mt 27,52). E é ainda a esta luz que o Símbolo dos Apóstolos proclama a descida de Jesus à mansão dos mortos. Perdão infinito. Vida verdadeira. Nascimento do alto (Jo 3,3.7). Luz fulgurante sobre as trevas. Caminho novo da nova humanidade.
Vida nova, vida eterna.

Texto usado pelo Pe. Jeová de Jesus Morais na homilia da sexta feira Santa.

Pe. Jeová Jesus Morais.

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